Resumo: Pesquisa em Destaque: Lundgren, E. J., Ramp, D., Middleton, O. S., Wooster, E. I. F., Kusch, E., Balisi, M., Ripple, W. J., Hasselerharm, C. D., Sanchez, J. N., Mills, M. & Wallach, A. D. (2022) A novel trophic cascade between cougars and feral donkeys shapes desert wetlands. Journal of Animal Ecology, 00:00–00. https://doi.org/10.1111/1365‐2656.13766. Apesar de estarem ausentes da maioria das regiões do mundo contemporâneo, as espécies da megafauna dominaram a dinâmica das comunidades ecológicas até o Pleistoceno tardio. A refaunação trófica é uma abordagem promissora para a restauração das interações da megafauna, de seus papéis funcionais e das cascatas tróficas delas decorrentes. A refaunação não‐intencional com grandes herbívoros não‐nativos, tais como equídeos, oferece oportunidades extraordinárias para os ecólogos entenderem as consequências do uso de espécies substitutas para restaurar as funções ecológicas da extinta megafauna nativa. Nesse contexto, é relevante entendermos o quanto os predadores nativos atuais podem impor controle de cima para baixo sobre mega‐herbívoros não‐nativos, e como cascatas tróficas oriundas de novas interações predador‐presa influenciam a biodiversidade e as funções ecossistêmicas. No Parque Nacional do Vale da Morte (Estados Unidos), Lundgren et al. reportam um experimento natural mostrando evidências contundentes de que onças pardas superaram a ingenuidade ecológica – i.e., os desajustes entre predadores e presas que não compartilham uma história evolutiva comum – e agora estão predando os indivíduos mais jovens de burros ferais com sucesso. Esses burros exóticos, cujas populações crescentes ameaçam a biota nativa, se tornaram o item mais frequente da dieta das onças pardas nessa região. Em áreas com onças pardas, os burros mudaram seus padrões espaço‐temporais de forrageio, tornando‐se diurnos e menos ativos. Por outro lado, os burros permanecem mais ativos e forrageiam durante o dia e à noite em áreas sem onças pardas. A interação entre onças pardas e burros desencadeou uma cascata trófica comportamentalmente mediada que emerge de uma "paisagem de medo", isto é, da percepção dos burros sobre a heterogeneidade espacial do risco de predação. Áreas com onças pardas tiveram menos solo pisoteado, menos trilhas de burros, e muito mais cobertura de dossel e vegetação no entorno da água. Os burros concentram a maior parte de suas atividades em terrenos topologicamente planos, os quais não apresentam lugares apropriados para o comportamento de emboscada das onças pardas e têm presença humana mais intensa, provavelmente agindo como escudos contra predadores. Lundgren et al. apresentam um sistema modelo promissor para o estudo de efeitos de pastadores temorosos sobre a estrutura comunitária no contexto de novas interações ecológicas em estabelecimento no Antropoceno. Se a cascata trófica emergente é transiente ou persistente, os papéis relativos dos efeitos diretos e indiretos como mecanismos subjacentes, e suas consequências para a estrutura, funcionamento e estabilidade da teia trófica são questões de interesse geral. Respondê‐las pode nos ajudar a elucidar os custos e benefícios de usar mega‐herbívoros não‐nativos na restauração funcional de ecossistemas permanentemente invadidos. [ABSTRACT FROM AUTHOR]