Estudos recentes indicam que valores de pressão arterial elevados não são raros nos doentes com drepanocitose, manifestando-se sobretudo na forma de hipertensão mascarada, e que as lesões endoteliais específicas desta doença aumentam o risco de eventos cardiovasculares agudos e crónicos. A síndrome da leucoencefalopatia posterior reversível é uma manifestação neurológica aguda potencialmente grave de uma crise hipertensiva e estes doentes apresentam um risco aumentado de a desenvolver. Doente do sexo feminino, de 11 anos, com o diagnóstico de drepanocitose no 1o ano de vida. Não apresentava alteração prévia dos valores de pressão arterial, mas encontrava-se medicada com enalapril por hipertrofia ventricular esquerda e insuficiência mitral e tricúspide. Foi internada por sépsis complicada de necrose osteoarticular, com difícil controlo infeccioso e álgico. Ao 16o dia de internamento, apresentou cefaleia, discurso inadequado, movimentos mastigatórios mantidos, olhar vago e não dirigido, ausência de resposta a ordens simples e valores de pressão arterial superiores ao percentil 99 de novo. A ressonância magnética crânio-encefálica foi compatível com síndrome da leucoencefalopatia posterior reversível. Foi instituída terapêutica analgésica, antihipertensora e antiepiléptica, com melhoria progressiva do quadro clinico e recuperação sem sequelas neurológicas. Uma das complicações agudas da hipertensão é a síndrome da leucoencefalopatia posterior reversível, que deverá ser cuidadosamente interpretada nos doentes com drepanocitose, que têm um risco aumentado de desenvolver outras condições neurológicas que requerem abordagens diferentes. O tratamento desta síndrome deve incluir a remoção do trigger, o controlo dos valores de pressão arterial com antihipertensores e a cessação da atividade epiléptica com antiepilépticos. Quando tratada precocemente, parece ser completamente reversível. Contudo, quando o diagnóstico e o tratamento são tardios, poderá estar associada a complicações graves. É assim essencial monitorizar a pressão arterial nos doentes com drepanocitose, evitando o desenvolvimento precoce de lesões de órgão alvo e complicações cardiovasculares agudas e crónicas, cujos doentes com drepanocitose têm maior risco de desenvolver.
Revista Portuguesa de Hipertensão e Risco Cardiovascular, N.º 94 (2023): Março / Abril